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domingo, 4 de janeiro de 2009

CINEMA: O poder do ICAIC


Instituto de Cinema foi uma das primeiras medidas culturais do governo revolucionário

Além de ser uma poderosa indústria de entretenimento, o cinema também é um fértil campo de discussão de idéias ao usar imagens e sons para difundir ideologias e transformar hábitos culturais. O cinema diverte e ao mesmo tempo consolida a imagem de povos e países. Filmes narram histórias e são determinantes na construção de uma memória para certos acontecimentos. A sétima arte gera lucros e também colabora para a formação de uma identidade nacional.

Não por acaso, após a Revolução Cubana, em 1959, o novo governo de Cuba fez uso do cinema para propagar seus ideais e modificar o modo de pensar dos cidadãos da ilha. Com uma premissa de discussão do cinema como forma de arte, a sétima arte ganhou espaço no governo revolucionário e foi utilizada como uma forma de crítica, de tomada de consciência, de experimentação e que mostrava a história a partir de uma nova leitura. O cinema deveria ser autêntico e cumprir um papel de revelador da verdade, funcionando como um instrumento importante no processo de luta.

Política cultural

Para que o cinema fosse mais uma ferramenta da nova luta, foi criado, pouco mais de 80 dias após a revolução, o Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográfica (ICAIC). A primeira instituição cultural da Revolução Cubana, fato revelador da importância do cinema nos planos do novo governo, marcou os primeiros anos da política cultural dessa nova fase da história do país, servindo como palco para um intenso debate entre a intelectualidade, cineastas, artistas e dirigentes revolucionários. A partir do ICAIC, discutia-se o caráter da arte revolucionária, a liberdade de produção e expressão do artistas e do escritor e o papel dos intelectuais na atualidade.

Maria Helena Rolim Capelato, na tese de doutorado defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, “O Instituto Cubano del Arte e Industria Cinematográficos (ICAIC) e a política cultural em Cuba (1959-1991)”, revela parte da história do Instituto e a posição privilegiada que ele ocupava em relação a outros organismos culturais vigentes no governo pós-revolucionário do período. “O governo instituído com a Revolução, em 1959, ambicionava promover em Cuba um grande desenvolvimento e ampla popularização dos bens culturais”, escreve. “Para isso, desde os primeiros anos da década de 1960, houve a promoção de muitos eventos massivos e foi dada prioridade às artes que mais facilmente atingem as massas - particularmente, o cinema - para que a propaganda política do novo governo abarcasse uma grande quantidade de pessoas”.

O Instituto gozava de considerável autonomia em relação aos mecanismos de controle governamental, por meio de ação dos cineastas e da mediação de sua direção, graças, principalmente, ao papel destinado pela Revolução ao cinema. “A prioridade que o novo governo deu à criação de um instituto de cinema era explicada com o argumento de que a sétima arte era um veículo ímpar de propaganda ideológica ‘da Revolução’ porque divulgava didaticamente, para as massas, as novas idéias e tinha um eficaz - e universal - poder transformador”, continua a pesquisadora Maria Helena.

Hegemonia latina

Mesmo com a questão política exercendo forte influência no ICAIC, uma de suas preocupações maiores era apresentar ao público cubano o que havia de melhor na cinematografia mundial, especialmente a de origem latino-americana. Pretendia-se criar uma hegemonia latino-americana e também um público para a produção local, além de levar o cinema para todos os lugares e recantos da ilha. Foi graças ao ICAIC que Cuba se tornou um pólo cinematográfico latino-americano de referência. Durante seu auge, Cuba produzia cerca de 400 filmes anualmente, revelando uma produção profícua e que abraçava várias estéticas e vertentes, ainda que o Instituto privilegiasse os documentários e filmes noticiosos.

“O Instituto direcionou seus primeiros recursos para a produção de noticiários, documentários e, em menor, peso, para as ficções, especialmente as que fossem crônicas do momento de transformação pelo qual Cuba passava. A necessidade da mobilização massiva, a urgência dessa produção e o entusiasmo que advinha daquele momento de total adesão à Revolução condicionaram o ritmo intenso das produções iniciais”, afirma a pesquisadora em sua tese.

Ainda que o Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográfica tenha perdido sua força com o passar dos anos e das transformações políticas e sociais que atingiram Cuba após a revolução, o ICAIC exerceu um importante papel de mediador entre cineastas e governo, entre a política cultural governamental e os projetos pessoais e coletivos dos realizadores. Através dele, Cuba investiu em festivais nacionais e internacionais e virou uma referência cultural na América Latina em termos de cinema, o que abriu caminho para outras iniciativas, como a criação da Escola Internacional de Cinema e TV de Cuba. Se hoje o cinema de Cuba não é mais como outrora e dependa de co-produções com outros países, ele entrou para o mapa junto com a Revolução de 1959.
FÁBIO FREIRE
Repórter

FIQUE POR DENTRO
Formação e aprendizado de cinema na ilha

Apesar de não ter nenhuma relação com a revolução de 1959, a Escola Internacional de Cinema e TV de Cuba (EICTV) é umas das principais iniciativas do país para a criação de um pólo cinematográfico na ilha. De caráter autônomo e sem vínculo com o governo cubano, apesar de receber apoio irrestrito, a escola foi criada em 1986 e é uma das atividades da Fundação do Novo Cinema Latino-Americano (FNCL), presidida pelo escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez. Concebida como uma escola de formação artística, a EICTV coloca em prática uma filosofia particular: a de fazer uso da experiência de cineastas em atividade capazes de transmitir conhecimentos através da prática. Mesmo sem nível universitário, a escola oferece um curso regular de formação e uma série de oficinas que abordam as mais diversas etapas da produção cinematográfica. Recebe alunos de toda a América Latina, Ásia e África e alguns cineastas cearenses tiverem sua formação na escola, caso de Wolney Oliveira.

CINEMATOGRAFIA

Soy Cuba (1964)
Co-produção entre Cuba e a União Soviética realizada pelo cineasta russo Mikhail Kalatosov. Apesar de toda a audácia do filme, que pretendia ser uma propaganda para divulgar a Revolução Cubana, a obra fracassou logo na estréia, em Havana e em Moscou, e ficou abandonada nas prateleiras do ICAIC até os anos 1990, quando os cineastas norte-americanos Martin Scorsese e Francis Ford Copolla a relançaram, conquistando grande repercussão

Morango e Chocolate (1993)
Produção dirigida por Tomás ´Tito´ Gutierrez Alea e Juan Carlo Tabio toca no tabu da homossexualidade, traçando um painel sobre a dignidade e a amizade entre dois homens: um culto homossexual e um jovem estudante comunista. Outros problemas que permeiam a realidade cubana são abordados: o mercado negro, a ´santeria´ (equivalente à nossa macumba), a posse ilegal de dólares, a ´vigilância´ nas habitações coletivas etc. Primeiro filme cubano a ser indicado ao Oscar

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