Um manifestante interrompeu aos gritos e foi expulso do plenário pela segurança do Supremo.
A
exigência de aprovação prévia em exame da Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB) para que bacharéis em direito possam exercer a advocacia foi
considerada constitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal
(STF). Por unanimidade, os ministros negaram provimento ao Recurso
Extraordinário (RE 603583) que questionava a obrigatoriedade do exame.
Como o recurso teve repercussão geral reconhecida, a decisão nesse
processo será aplicada a todos os demais que tenham pedido idêntico.
A
votação acompanhou o entendimento do relator, ministro Marco Aurélio,
no sentido de que a prova, prevista na Lei 8.906/94 (Estatuto da
Advocacia), não viola qualquer dispositivo constitucional. Concluíram
desta forma os demais ministros presentes à sessão: Luiz Fux, Dias
Toffoli, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto,
Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso.
O
recurso foi proposto pelo bacharel João Antonio Volante, que colou grau
em 2007, na Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), localizada em
Canoas, no Rio Grande do Sul. No RE, ele afirmava que o exame para
inscrição na OAB seria inconstitucional, contrariando os princípios da
dignidade da pessoa humana, da igualdade e do livre exercício das
profissões, entre outros.
Votos
O
relator do caso, ministro Marco Aurélio, considerou que o dispositivo
questionado do Estatuto da Advocacia não afronta a liberdade de ofício
prevista no inciso XIII, artigo 5º, da Constituição Federal, conforme
argumentava o bacharel em direito autor do recurso. Para o ministro,
embora o referido comando constitucional impeça o Estado de opor
qualquer tipo de embaraço ao direito dos cidadãos de obter habilitação
para a prática profissional, quando o exercício de determinada profissão
transcende os interesses individuais e implica riscos para a
coletividade, “cabe limitar o acesso à profissão em função do interesse
coletivo”. “O constituinte limitou as restrições de liberdade de ofício
às exigências de qualificação profissional”, afirmou o ministro Marco
Aurélio, ao citar o próprio inciso XIII, artigo 5º, da Carta Magna, que
prevê para o livre exercício profissional o respeito às qualificações
estabelecidas em lei.
Primeiro
a seguir o voto do relator, o ministro Luiz Fux apontou que o exame da
OAB caminha para a inconstitucionalidade se não forem criadas formas de
tornar sua organização mais pluralista. “Parece plenamente razoável que
outros setores da comunidade jurídica passem a ter assento nas comissões
de organização e nas bancas examinadoras do exame de Ordem, o que,
aliás, tende a aperfeiçoar o certame, ao proporcionar visão mais
pluralista da prática jurídica”, disse.
Para
Fux, manter a elaboração e organização do exame somente nas mãos de
integrantes da OAB pode suscitar questionamentos em relação à
observância, pela entidade, de princípios democráticos e republicanos.
“Cumpre à OAB atender às exigências constitucionais de legitimação
democrática da sua atuação, que envolve, entre outros requisitos, a
abertura de seus procedimentos à participação de outros seguimentos da
sociedade”, reiterou. Para o ministro, a forma como o exame é produzido
atualmente é uma “falha” que acarretará, no futuro, “a efetiva
inconstitucionalidade da disciplina do exame da OAB”.
Antes,
porém, ele afirmou que o exame em si é a medida adequada à finalidade a
que se destina, ou seja, a “aferição da qualificação técnica necessária
ao exercício da advocacia em caráter preventivo, com vistas a evitar
que a atuação do profissional inepto cause prejuízo à sociedade”. Luiz
Fux ressaltou que o desempenho da advocacia por um indivíduo de formação
deficiente pode causar prejuízo irreparável e custar a um indivíduo a
sua liberdade, o imóvel em que reside ou a guarda de seus filhos.
“Por
essas razões, existe justificação plausível para a prévia verificação
da qualificação profissional do bacharel em direito para que possa
exercer a advocacia. Sobreleva no caso interesse coletivo relevante na
aferição da capacidade técnica do indivíduo que tenciona ingressar no
exercício profissional das atividades privativas do advogado”, disse.
Ele complementou que “fere o bom senso que se reconheça à OAB a
existência de autorização constitucional unicamente para o controle a
posteriori da inépcia profissional, restringindo sua atribuição nesse
ponto a mera atividade sancionatória”.
Também
acompanhando o relator, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha fez
breves considerações sobre a matéria. Ela frisou que o exame da OAB
atende plenamente a regra constitucional que condiciona a liberdade ao
trabalho ao atendimento de qualificações profissionais estabelecidas em
lei (inciso XIII do artigo 5º da Constituição). O Estatuto da Advocacia,
acrescentou ela, foi produzido coerentemente com o que a sociedade, em
um Estado democrático, exige da OAB. A ministra afirmou ainda que os
provimentos previstos no Estatuto (parágrafo 1º do artigo 8º da Lei
8.906/94) são necessários para regulamentar os exames. “O provimento foi
a fórmula encontrada para que a OAB pudesse, o tempo todo, garantir a
atualidade da forma de qualificação a ser exigida”, disse.
Em
seguida, o ministro Ricardo Lewandowski disse que se aplica ao caso a
chamada “teoria dos poderes”, desenvolvida em 1819 na Suprema Corte
norte-americana. Reza essa tese que, quando se confere a um órgão
estatal determinadas competências, deve-se conferir-lhe, também, os
meios para executá-las.
Em
sintonia com essa teoria, portanto, conforme o ministro, o Estatuto da
Ordem (Lei 8.906/94), com base no artigo 22, inciso XVI, da Constituição
Federal, ao regular o exercício da advocacia, conferiu à OAB os poderes
para que o fizesse mediante provimento.
No
mesmo sentido, segundo ele, o artigo 44, inciso II, do Estatuto da
Ordem é claro, ao atribuir à entidade a incumbência de “promover, com
exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos
advogados em toda a República Federativa do Brasil”.
Por
seu turno, o ministro Ayres Britto destacou que o fato de haver, na
Constituição Federal, 42 menções à advocacia, à OAB e ao Conselho
Federal da OAB já marca a importância da advocacia em sua função de
intermediária entre o cidadão e o Poder Público.
Ele
citou, entre tais passagens constitucionais, o artigo 5º, inciso XIII,
que dispõe ser livre o exercício de qualquer trabalho, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer. Portanto, segundo
Ayres Britto, o dispositivo faz uma mescla de liberdade com preocupação
social, que é justamente o que ocorre com o exame contestado no RE,
pois, segundo o ministro, ele é “uma salvaguarda social”.
O
ministro ressaltou, também, o artigo 133 da CF, uma vez que esse
dispositivo estabelece que o advogado é indispensável à administração da
Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da
profissão, nos limites da lei.
Também
se manifestando pelo desprovimento do RE, o ministro Gilmar Mendes
disse que a situação de reserva legal qualificada (o exame da OAB) tem
uma justificativa plena de controle. No seu entender, tal controle não
lesa o princípio da proporcionalidade, porque o exame contém abertura
bastante flexível, permitindo aos candidatos participarem de três exames
por ano.
Quanto
às críticas sobre suposto descompasso entre o exame da OAB e os
currículos das faculdades de direito, Gilmar Mendes disse acreditar que
essa questão pode ser ajustada pela própria OAB, em articulação com o
Ministério da Educação, se for o caso.
Para
o decano da Corte, ministro Celso de Mello, é lícito ao Estado impor
exigências com “requisitos mínimos” de capacidade, estabelecendo o
atendimento de certas qualificações profissionais, que sejam condições
para o regular exercício de determinado trabalho, ofício ou profissão.
Segundo o ministro, as prerrogativas dos advogados traduzem meios
essenciais destinados a proteger e amparar os “direitos e garantias” que
o direito constitucional reconhece às pessoas.
Ainda
de acordo com o ministro Celso de Mello, a legitimidade constitucional
do exame da ordem é “plenamente justificada”, principalmente por razões
de interesse social. Para o decano, os direitos e garantias individuais e
coletivas poderão resultar frustrados se for permitido que pessoas
“despojadas de qualificação profissional” e “destituídas de aptidão
técnica” – que são requisitos “aferíveis, objetivamente pela prova de
suficiência ministrada pela Ordem dos Advogados do Brasil" – exerçam a
advocacia, finalizou o ministro, acompanhando integralmente o voto do
relator.
Os ministros Dias Toffoli e Cezar Peluso acompanharam integralmente o voto do relator.
Assessoria de Comunicação do STF.
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